A Coragem de ser Poeta
Por Teresinka Pereira – USA
Publicado na edição nº 121 (Ed. Jun/jul 2014) da
Revista Brasília – páginas 36 e 37
O
poeta é Rômulo Ferreira.
Seus
versos são elegantes, essenciais e realistas.
Não
precisam de título:
Meu poema é quase nada
É quase tudo
Anda no meio, pelo meio
Criando meios de sobreviver
Nesta jaula de criar solidão.
Estes
versos descrevem bem o processo poético de um verdadeiro poeta profissional,
cujo trabalho é escrever poesia, fazer livros de poesia e vender a poesia, para
que não só o poeta possa sobreviver de seu ofício, mas também a poesia possa
nele sobreviver.
Faz
uns anos conheci em Denver, no estado do Colorado, aqui nos EUA, um grupo que
se dava o nome de “Street Poets”. Eles faziam um show nas ruas de Denver, mas
eram de diferentes partes do país, principalmente de Nova York. Um dia os
convidei a uma reunião em minha casa e o show que fizeram foi sensacional! A
poesia declamada e atuada por cada um deles e algumas em conjunto, era de
primeira classe, sonora e podia ser cantada, conteúdo original, estrutura
agradável. Eles eram poetas profissionais, mas adotando o nome de “Poetas de
Rua” faziam seu comércio poético lucrativo e libertário. O chefe do grupo, com
o qual correspondi durante algum tempo era Dan Propper. Perdemos o contato
porque ele organizava grupos também em Nova York, nas cidades da Califórnia e
não fixava residência em nenhum lugar. Mas deixou comigo para sempre a
admiração e a saudade.
Agora
me aparece Rômulo Ferreira, um street poet no Rio de Janeiro, que diz em seus
versos:
Meu poema nem é meu
Ele faz parte de um povo
Que caminha as mínguas
Pelas ruas daqui,
De onde manifesto desejos.
Estes
versos foram escritos, como ele mesmo
disse numa carta, numa máquina de escrever “Ollivett”, não em computador, em
papel que ele mesmo confecciona em casa.
E como os “street poets” americanos, é também um pouco nômade: Rômulo Ferreira
não é carioca, é mineiro como eu. Deslocado de sua cidade natal, que é a famosa
cidade da inconfidência Mineira, a de Ouro Preto, tem viajado muito colhendo
experiências cosmopolitas importantes: esteve no Chile, inclusive conheceu a
casa de Pablo Neruda, do qual é grande admirador.
Rômulo
Ferreira não é o único “street poet” do Brasil. Em Brasília está outro famoso
poeta que vende seus livros na rua, desde muito jovem: Nicolas Behr. Ele
escreveu um famoso poema sobre o rato do computador que eu traduzi para o
inglês: “YES, THE MOUSE BROUGHT THE STAMP” e que ainda está correndo o mundo.
Rômulo
Ferreira não é só vendedor de livros, é um empresário em todo sentido da
palavra. Tem um informativo literário chamado AMEOPOEMA, como segundo E ao
revez, que eu nãoposso reproduzir no computador onde escrevo isto, e tem um
logo relativo ao poeta de rua que ponho aqui, porque este logo vale mais que um
poema:
((((logo
circular do ameopoema))))
Aproveito
aqui este logo para anunciar que a Associação Internacional de Escritores e
Artistas, tem um membro de honra que é artista de rua: Rafael Pio. Ele é
paulista, mas foi tocar com seu grupo nas ruas do Rio de Janeiro e foi
molestado pela polícia da cidade. Então ele enfrentou o conflito e ganhou,
conseguindo que a administração da cidade e a polícia mudassem alei para
permitir os concertos de rua. Um grande pioneiro, o artista Rafael Pio!
Mas
que tudo, o artista, músico, poeta de rua são os patrocinadores de nossa
liberdade. E como Michel de Montaigne disse há muito tempo atrás, “A VERDADEIRA LIBERDADE É TER TODO O PODER
SOBRE SI MESMO.”
O
poema cujos versos citei acima termina assim:
Meu poema que dou ao mundo
É uma pedra
A gota d’água
No copo cheio da ignorância...
É uma farpa fina
Que te cortará e nunca mais encontrará
A palavra cicatrizante.
Pessoalmente
não acredito em classes sociais, mas a escritura pode nos apresentar uma certa
classe diferenciando o escritor
clássico, que conhece a história da literatura e o criador popular.
Entretanto o escritor Reis de Souza, autor de tantos livros bem conhecidos pela
crítica brasileira, disse o seguinte em favor de quem sabe escrever: “O ESCRITOR BRASILEIRO, DE QUALQUER NÍVEL
REPRESENTA A PARTE MAIS CULTA DA SOCIEDADE, SUA ESSÊNCIA MAIS PURA E PARCELA
QUE TECE A PRÓPRIA ALMA NACIONAL.” E talvez seja bom reconhecer a verdade
dessas palavras do colega Reis de Souza. O poeta que pode escrever, imprimir e
vender sua própria poesia e com isto marcar o pensamento e o sentir do povo que
passa pela rua, não é só um grande empresário, é um criador de intelectuais.
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